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ESPECIAL 33ª MOSTRA – Mãe

novembro 19, 2009

Obsessão

Com belo roteiro e fotografia, história de mãe que luta pela inocência do filho é escancarada pelas reviravoltas do suspense do diretor coreano

NOTA: 9

A Mostra acabou faz tempo, sim, eu sei. Mas como não tive oportunidade de escrever durante aquelas semanas, deixo aqui meu registro sobre um único filme deste ano que julguei realmente muito bom – dentre os outros 5 que vi.

Para começo de conversa, anuncio que esta foi a última vez que eu fui a cinema de shopping tentar assistir algum filme que não esteja ligado à indústria hollywoodiana. Infelizmente, Cinemark nenhum é capaz de atrair bom comportamento dentro de uma sala escura por mais de uma hora. Posso dizer que não foi desta vez que o clima do shopping – e, obviamente, dos freqüentadores – prejudicou a minha relação com o longa em questão.

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Uma trilha sonora dançante abre a primeira cena. Uma mulher – presumidamente, “a mãe” – dança alucinadamente ao ritmo da trilha sonora, em uma espécie de epifania esquizofrênica. Corte. Sem saber como ou porque isso assim sucedeu, voltamos ao início de tudo.

Madeo, “mãe”, em coreano, é primeiramente uma apologia à fotografia cinematográfica, e também a história triste desta mãe, excessivamente cuidadosa com seu único filho. A mulher, inominada – representante de todas as mães – tem um filho com deficiência mental. Do-Joon é um rapaz jovem, que tem seu charme, mas não conseguiria viver longe da proteção que sua progenitora oferece. Acompanhado do amigo Jin Tae, rapaz de caráter duvidoso, Do-Joon entra em toda sorte de problemas.

A mãe, sempre disposta a proteger seu rebento, age com passividade às trapalhadas do filho – a cena na qual, depois de sair da delegacia, ela lhe oferece uma tigela de sopa, é memorável –, trabalha com humildade em uma oficina durante o dia e, escondida, aplica acupuntura nas amigas em busca de trocados extras.

Sem se dar conta da própria situação, uma noite Do-Joon se embriaga em um bar, promovendo uma das melhores fotografias do longa, e sai pelas ruas, atrás de uma bela estudante. A menina, ao entrar em uma casa aparentemente abandonada – por uma porta que, atrás de suas sombras mais escuras que a noite ali fora, esconde todos os medos do rapaz -, despista Do-Joon que, realmente desistindo da empreitada, retorna para casa.

Com uma edição extremamente bem feita, a cena seguinte mostra Do-Joon sendo preso, injustamente acusado do assassinato de Moon Ah-Jung, a menina que ele vira na noite anterior. Sem se lembrar do ocorrido e sem a menor pretensão de que tenha sido mesmo culpado, Do-Joon é levado da mãe que, sem reação, já demonstra alguns sinais de demência e dependência do rapaz.

Cheio de sustos e reviravoltas, um suspense hitchcockiano, o diretor Bong Joon-ho explora belíssimas fotografias em close, quase em slow motion, abusa dos recursos da trilha sonora, encaixando silêncios e efeitos nas horas mais apropriadas, exaltando assim a qualidade primordial do suspense.

A mãe, em seu desespero, recorre a advogados que não a ajudam, enquanto tenta fazer justiça com as próprias mãos, inconformada com o fato de pensarem que aquele mesmo menino, abobado e ingênuo, poderia cometer um crime tão hediondo. Além de provocar-nos sentimentos como pena, angústia, claustrofobia e tristeza, há também toques leves de comédia, criando um envolvente clima melodramático, com um dos melhores desfechos da 33ª Mostra.

Se a cada momento nos é feita uma revelação na narrativa, é também com muita habilidade costurada no restante do roteiro, surpreendendo a cada instante, fazendo-nos chegar a conclusões precipitadas que, nos minutos seguintes, são logo contestadas ou desconstruídas.

Cheio de belas metáforas e simbolismos, as memórias de Do-Joon são misturadas com eficácia com a realidade a que está submetido dentro da prisão. Sem qualquer ajuda, e demonstrando sua ingenuidade penalizante, a mãe mergulha de cabeça, corpo e alma na investigação, usando meios duvidosos – mas totalmente coerentes e verossímeis ao caso – para conseguir as informações de que precisa.

Perto do desfecho final, retornamos à cena de abertura, e entendemos que não só a esquizofrenia, como a própria loucura, tomaram conta da mulher. A longevidade do enredo, apesar de cansativa, é necessária.

Saímos da sala de cinema convencidos de que era exatamente aquilo que esperávamos como um final digno do roteiro. Era, aliás, um final semelhante a este que esperava ter visto em Mau Dia para Pescar e que, infelizmente, não veio. A cena final, extasiante, resume de maneira fantástica todos os dilemas do longa, como se só houvesse uma única solução para todos aqueles problemas.

Além de muito bem produzido/dirigido/escrito, a escolha dos atores foi mais do que acertada. Kim Hye-ja e Won Bin estão brilhantemente caracterizados como mãe e filho, e todo o elenco cumpre seus papéis de maneira formidável. Isso, sem dúvida, é só um ponto a mais para os raros pontos negativos que eu pude observar. Um deles? A cena mal-feita da mãe debruçando-se sobre o vaso talvez tenha sido o único erro de direção do longa inteiro.

Título Original: Madeo
Direção: Bong Joon-ho
Gênero: Suspense
Ano de Lançamento (Coreia do Sul): 2009
Roteiro: Bong Joon-ho e Park Eun-kyo
Trilha Sonora: Lee Byeong-woo
Fotografia: Hong Kyung-Pyo
Tempo de Duração: 128 minutos
Com: Won Bin [Yoon Do-Joon], Kim Hye-ja [mãe], Jin Goo [Jin Tae] e Moon Hee-ra [Moon Ah-jung] 

2 comentários

  1. adorei o post!gente, eu tenho que, definitivamente, fazer uma listinha de filmes com os que você posta aqui =P:*


  2. Noooooossaaaa, também amei este filme. Como trabalhou bem a mãe obcecada. Fiquei pasma ao saber que ela é atriz de comédia na Coréia do Sul…

    Gostei da análise e não me lembro da cena do vaso…bela desculpa para rever o filme…



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