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Hellboy

maio 19, 2010
Uma face do demônio

Apesar de ser uma interessante e divertida construção do personagem de Mike Mignola, Hellboy tem sérios problemas de roteiro

NOTA: 7

O que faz de um homem, um homem? Suas origens? Suas conquistas? Este é o mote que inicia o primeiro filme de Guillermo del Toro sobre personagens em quadrinho – como anda tão na moda ultimamente. No início, acompanhamos uma breve introdução do tema de Hellboy (história originalmente criada por Mike Mignola e publicada pela Dark Horse em 1998), com narração do próprio professor Trevor Bruttenholm em 1944, então com 28 anos e já um paranormal a serviço do governo de Franklin Roosevelt.

À época, os nazistas buscavam um meio de unir ciência e magia negra para ter vantagens na 2ª Guerra. A intenção era libertar os sete deuses do caos, presos em uma dimensão paralela, para dominar o mundo. Diz o letreiro inicial que estes deuses iriam, com ajuda, sair da prisão de cristal que os prende, conquistar a terra e incendiar os céus.

Mas por que é necessário saber disso? Porque, primeiro: a história do filme Hellboy, se contada para quem nunca leu os quadrinhos (o que é o meu caso), é uma confusão. Segundo: estes eventos explicam como o diabo – ainda criança – foi propositalmente libertado da outra dimensão e caiu na nossa. O mais curioso é que o responsável por essa ação é ninguém menos do que o místico russo Grigori Rasputin – aqui demonizado, estritamente ligado à magia negra em questão, que usa até mesmo a palavra “ragnarók” para indicar o fim do mundo. O cineasta fez que com a vida de Rasputin fosse estendida (ou que ele ressuscitasse), e o transformou…bem, no vilão, o que mais esperavam?

Passada a ação inicial, vamos direto à história do pequeno diabo encontrado neste dia pelo professor, que denomina corretamente a relação de “um pai desesperado para um filho indesejado”. Criado em um ambiente propício – o curioso Departamento Paranormal de Defesa -, Hellboy não envelhece como os homens. Cronologicamente desde seu achado ele tem 60 anos, mas sua mentalidade e físico indicam que ele está na faixa dos 20.

Escondendo mistérios intrigantes – como todos os fatos envolvendo a queda de Hitler -, o departamento do professor Bruttenholm é uma espécie de quartel-general. Lá cria-se especialistas em caçar monstros e outras criaturas não pertecentes ao nosso mundo, chefiados, é claro, por Hellboy – carinhosamente chamado de Red. Para tentar amenizar o terrível gênio do demônio, o pai da criatura contrata o incrédulo agente John Myers – que, em uma cena brilhante, observa os quadrinhos da Dark Horse e o próprio Hellboy ao mesmo tempo, indicando que por trás da história toda há um fundo de verdade.

Usando métodos completamente convincentes (e fantásticos) de maquiagem e efeitos visuais para criar o aspecto dos personagens do DPD, é muito interessante observar as bizarras características do gentil Abraham Sapiens (homenagens nada sutis à raça humana e a Abraham Lincoln), ou do próprio Hellboy. Seu corpo vermelho e musculoso, os chifres lixados (para tentar amenizar a horrenda aparência), a cauda e, principalmente, a roupa surrada como de muitos e longos anos em missões corpo-a-corpo, por mais absurdos que pareçam, são convincentes. Também é preciso ressaltar as belíssimas construções de Sammael, o cão do inferno, todas as vezes que ele renasce.

Com imagens sombrias envolvendo a religião (indicando o ateísmo ou ceticismo de del Toro?) e figuras ao mesmo tempo interessantes e repulsivas – como Kroenen, o melhor e mais assustador assassino de Hitler -, o diretor consegue transpor o mundo absurdo de Mignola para a tela com grande eficácia. Alguns problemas de roteiro, contudo, tornam o filme somente mais um do gênero – que agora figura com nomes de muito mais peso como Homem de Ferro, Batman e a trilogia X-Men.

O que realmente importa de Hellboy não é exatamente a história contada – uma vez que ela é quase simplória -, mas os personagens envolvidos, que apresentam os maiores graus de profundidade dramática e também as maiores decepções. No topo da primeira lista com certeza estão Hellboy e Liz, os improváveis e futuros amantes separados pela feiúra do demônio (para ele) e pela incontrolável pirocinese da moça (para ela). Lidamos com as duas personalidades conflitantes, o humor ácido e bem pontuado de Red, e a singela atuação de Selma Blair – mais linda do que nunca.

A excelente trilha sonora de Marco Beltrami e a também perfeita sonoplastia pontuam as frases politicamente incorretas do herói com brilhantismo, e realmente vibramos com cada piadinha que ele faz ao se deparar com o perigo (em um diálogo, Abe diz “em 5 segundos, Sammael depositou 3 ovos em seu braço”, ao que ele responde ironicamente “e nem me pagou uma bebida”). Ou ainda, a hilária “participação” de Ivan Climatovich, evidenciando que são estes momentos que fazem o filme.

Do outro lado estão Myers – personagem completamente dispensável, que aparentemente serviu somente para provar a Liz de que Red é seu grande amor – e, infelizmente, Rasputin. Sem emoção ou grande impacto, o vilão nunca chega a de fato nos assustar, seja com seu aspecto sombrio ou por suas intenções maléficas. Justamente por lidar com um ser indestrutível como Hellboy, Rasputin surge como um vilão fadado ao fracasso – o que não é exatamente o que esperamos de um embate maniqueísta.

O final chega a ser frustrante. Depois de tanta ação, o herói rapidamente se livra de um gigantesco monstro, justo a tempo de salvar Liz. Sabemos que ele é imortal, mas foi tudo muito depressa! O modo como Myers encerra o questionamento levantado pelo professor Bruttenholm no começo é piegas, previsível e até mesmo um pouco constrangedor. É uma quebra brusca de enredo e de ritmo, que leva o espectador a absorver as cenas finais e simplesmente ignorá-las, como se não fizessem parte do resto da trama.

Tìtulo Original: Hellboy
Direção: Guillermo del Toro
Gênero: Aventura
Ano de Lançamento (EUA): 2004
Roteiro: Guillermo del Toro, baseado em estória de Guillermo del Toro e Peter Briggs e nos personagens criados por Mike Mignola
Trilha Sonora: Marco Beltrami
Tempo de Duração: 112 minutos
Com: Ron Perlman (Hellboy), Doug Jones (Abraham Sapien), David Hyde Pierce (Abraham Sapien voz), Selma Blair (Liz Sherman), John Hurt (Trevor Bruttenholm), Rupert Evans (John Myers), Corey Johnson (agente Clay), Karel Roden (Grigori Rasputin), Biddy Hodson (Ilsa) e Jeffrey Tambor (Tom Manning).

4 comentários

  1. Ainda não vi o 1 por isso não lerei a resenha a fim de evitar spoilers, mas gostei bastante do The Golden Army! Alguns filmes de heróis são legais, mal vejo a hora de ver Iron Man 2.


  2. Safú, obrigada pelo comentário. Eu achei o Golden Army mais legal que este primeiro, por incrível que pareça.

    Semana que vem farei um post sobre ele, volte pra conferir ;]

    Ah! Sim, assista Homem de Ferro 2. Não é tão bom quanto o primeiro, mas é bem divertido!


  3. Então… Hellboy é, atualmente, o heróis que eu mais acompanho, seja por HQ ou no cinema. O trabalho que o Del Toro fez é uma faca de dois gumes para os fãs do personagem. Primeiro porque ele conseguiu ser fiel a idéia central das Obras do Mignola, que é basicamente mostrar que mesmo o “mal puro” tem escolhas e pode ser “bom”; segundo, porque ele não seguiu nenhum dos arcos das HQs.

    Eu acho os filmes sem igual. Você tem tudo o que se refere ao mundo do Hellboy em apenas algumas horas. E também não me importo muito do Del Toro ter criado uma linha temporal e uma trama a parte das HQs, porque o trabalho ficou acima da média.

    Parabéns pela crítica, você conseguiu passar bem o que é o filme e espero para ler sobre o Golden Army.


  4. Vi Hellboy (2004) hoje! Gostei, mas concordo com você, o final ficou devendo. Muito espremido. Curti os efeitos especiais, mas preferi Golden Army.



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