Como sempre magnânimo, Almodóvar presenteia o público pela primeira vez com filme sob a ótica de um homem
NOTA: 9
Ele é um dos meus diretores preferidos, considerado (não só por mim) como um dos maiores de sua geração: revolucionário, vanguardista. Ela tem se mostrado, a cada filme no qual atua, uma atriz de peso, consistente, responsável por grande parte do sucesso da película. Juntos, eles fazem uma das duplas mais poderosas do cinema mundial – hollywoodiano e europeu. Pedro Almodóvar e Penélope Cruz, juntos há exatos 10 anos (completados quando do lançamento deste aqui), vem evoluindo na parceria a cada nova produção.
Apesar de não ser um filme absolutamente genial, o novo Abraços Partidos é visto – repito, não só por mim – como uma das obras-primas do diretor. Almodóvar criou um padrão que pode ser discernido a quilômetros de distância. A paleta de cores está sempre saturada com cores berrantes, as figuras femininas são fortes, verdadeiros estereótipos da mulher espanhola (muito baseadas na figura de sua mãe), os homens são meros objetos de entretenimento, descartáveis; o diretor conquistou o mérito de retratar fielmente seu povo. Até mesmo o polêmico Má Educação – que conta a história de um travesti – é uma clara e chocante imagem das mulheres.
Esse último longa, contudo, é uma contradição do ponto de vista narrativo e considerando a trajetória do cineasta. Abraços Partidos conta a história do escritor, roteirista e diretor Mateo Blanco, agora cego, que assinava todos seus textos com o pseudônimo de Harry Caine.
Nos primeiros minutos, vemos uma cena tipicamente almodovariana: Mateo usa de sua cegueira para atrair uma linda jovem loira. A câmera, acompanhando o corpo e as curvas da moça como se fosse os olhos do personagem, e o que acontece depois – tudo indica a essência do cineasta. Isso passado, vemos que Mateo tem por companhia a amiga Judit e o filho desta, Diego. Ao ser constantemente questionado pelo menino sobre a historia que mudou a vida de todos, Mateo decide contar a ele a verdade.
Voltamos há 14 anos atrás, quando o roteirista estava encarregado na produção de um filme em que Lena era a atriz principal. Apesar de não ser das mais competentes, Mateo decide dar uma chance à amadora, encantado principalmente com sua beleza. Mergulhando em uma história sombria – uma vez que Lena estava comprometida, ainda que a contragosto, com o produtor do filme em questão – esses personagens estão envoltos em obscuridade, mistério, paixões dilacerantes, ciúmes e (claro) morte.
De tom clássico, percebemos muitos elementos da construção do diretor, diluídos pela força dos próprios personagens. Desta vez, há somente um relance do poder das mulheres – quando, em raros momentos, vemos “o filme dentro do filme”. O tom dramático está, curiosamente, concentrado na figura de Mateo/Harry. Após descobrir que, ao ficar cego em um trágico acidente, o protagonista passa a atender somente pelo pseudônimo, como a morte e o renascimento de uma pessoa.
Com a habilidade costumeira, Almodóvar traça o perfil deste grupo de pessoas intimamente relacionadas, em cenas belíssimas como se fossem quadros – e aqui a influência de Carlos Saura torna-se evidente até mesmo no modo de narrar a estória. A estética de Abraços Partidos talvez seja um de seus maiores méritos, uma vez que grande parte do público não tenha se identificado com a “falta de Almodóvar” nesta produção.
Um misto de incredulidade e familiaridade são os sentimentos que norteiam o espectador. Afinal, com Almodóvar todas as histórias são – ou parecem ser – possíveis. Até mesmo a mais folhetinesca soa tão verdadeira quanto a nossa própria realidade.
É possível reencontrar atores tão queridos (e maravilhosos) quanto os personagens que interpretaram nas décadas de colaboração, como a própria Penélope que, em uma única cena, realiza o sonho de todos os homens se despindo despudoradamente; Blanca Portillo, como sempre dando show de atuação; Lola Dueñas, em um papel tão cômico quanto pequeno para sua grandeza, entre outros não tão famosos.
Titulo Original: Los Abrazos Rotos
Direção: Pedro Almodóvar
Gênero: Drama
Ano de Lançamento (Espanha): 2009
Roteiro: Pedro Almodóvar
Trilha Sonora: Alberto Iglesias
Fotografia: Rodrigo Prieto
Tempo de Duração: 128 minutos
Com: Lluís Homar (Mateo Blanco/Harry Caine), Penélope Cruz (Lena), Blanca Portillo (Judit García), José Luis Gómez (Ernesto Martel), Tamar Novas (Diego), Rubén Ochandiano (Ray X/Ernesto Jr.), Marta Aledo (Maribel) e Lola Dueñas (leitora de lábios).